Vniversale descrittione di tvtta la terra conoscivta fin qvi

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Momento de Alva Alegria

Era mais uma tarde de inverno rigorosa. O frio dançava com a chuva lá fora, enquanto num canto do meu quarto tentava fazer o dever. Por mais que eu me abrigasse, era como se o maléfico ar que respirava congelasse minhas entranhas, deixando-me inerte e incapaz de tornar o que lia em algo claro e coeso. O barulho da cadeira que gemia sinalizava minha impaciência, tão intensa que eu agora sofria de uma tremenda enxaqueca. O remédio era ao mesmo tempo deixar o quarto como também uma pílula sobre a mesa da cozinha. Ao ver tamanha bagunça e nenhum copo limpo, me pus a lavar a louça, ao passo que minhas mãos eram acalentadas pela água morna. Sem interesse algum, contemplava pela janela a cidade que eu me encontrava. Fétida. Esquecida. Tediante. Mas ainda sim cidade que prosperei parte da minha vida. A ingratidão que sentia misturava-se à solidão que, por ser diferente, consumia-me por não ser daqui. O gozo sentido pela água cada vez mais quente lavava tais pensamentos de mim. Afinal, eram só mais alguns meses até dizer Adeus àquela cidadezinha. E, para quem esperou quase uma vida toda, isso não era nada.
Quando a torneira foi parada para secar a louça, percebi algo estranho: aparentemente, caía algum tipo de poeira, talvez cinzas, do apartamento de cima. Com uma curiosidade movida pela inércia do momento, empurrei a janela de maneira que se abrisse. O engraçado, todavia, não era a clareza da poeira, mas sim sua frescura. Com um olhar mais apurado sobre aquela estranha substância, percebi que ela derretia. A partir disso, era como se um motor velho fosse depois de muito tempo, acionado. O calor que sentia por dentro nada tinha a ver com a água que antes esquentara minhas mãos. Faíscas de prazer cintilavam nos meus olhos. Era o sentimento do novo, a excitação que quebra nossas rotinas, assim como um parente muito querido que bate à porta, fazendo uma calorosa e inesperada visita.

No andar de cima, Matias não via a hora de terminar de esvaziar o modesto freezer daquela antiga geladeira. Era tão velha quanto difícil de tirar os cubos de gelo, que quando removidos à força criavam uma consideravel camada de gelo fino, e, se não limpa, cairia no chão podendo até causar algum acidente. O copo de whisky jazia sobre a mesa com seus dois cubos, quebrando a uniformidade do vermelho alaranjado, assim como sinalizando que a bebida estava pronta para aquecer quem, naquela rigorosa tarde de inverno, a bebesse.



-gabriel

Um comentário:

Arthur Wilkens disse...

gostei do clima. bem escrito =)